Uma característica que marca o Transtorno do Espectro Autista é a dificuldade nos processos de autorregulação emocional. O autismo é marcado por isso: uma compreensão atípica de como percebemos o mundo devido às nossas alterações sensoriais e tentativas frustradas de se regular. Com essa dificuldade, os nossos sistemas entram em crise e podemos nos sentir culpados, pois não tivemos a oportunidade de aprender a lidar com as emoções e comunicar adequadamente o que estamos sentindo, sobretudo quando o diagnóstico é tardio.
Entender o que sentimos e comunicar sobre isso é um processo relacional chamado co-regulação. A co-regulação é definida como interações afetuosas e responsivas que fornecem apoio, o treinamento e a modelagem que as crianças precisam para compreender, expressar e modular seus pensamentos, sentimentos e comportamentos. Para que uma criança autista seja capaz de se autorregular, a co-regulação precisa ocorrer, entretanto os processos de regulação precisam compreender as características únicas da pessoa autista.
A dificuldade no autismo é que, desde a primeira infância somos tomados por dificuldades de comunicação que influenciam a reciprocidade socioemocional, ou seja, não respondemos adequadamente às interações sociais e afetos e a comunicação não verbal não comunica o que deveria. Na dificuldade de expressar o que sentimos, encontramos justamente o isolamento. Se é difícil comunicar, é difícil ser compreendido. Se é difícil ser compreendido, pouco temos espaços para criar vínculos que permitem processos de co-regulação.
Se o autismo não é compreendido ainda na infância, a pessoa pode ser impedida de se regular adequadamente, tendo comportamentos adaptativos repreendidos por serem considerados inadequados ou estranhos. Neste caso, a co-regulação se torna problemática, seguindo padrões normativos, impedindo o aprendizado de processos de autorregulação.
Co-regulação como ponte para a autorregulação
A Terapeuta Ocupacional Kelly Mahler explica a co-regulação como o que todos nós precisamos ao entrarmos neste mundo. Todos nós precisamos de alguém em nosso mundo para intervir e nos ajudar a atender às necessidades do nosso corpo, para atender às nossas necessidades de regulação, seja uma regulação do sistema nervoso, ou talvez também para atender às nossas necessidades de sobrevivência, como nos oferecer comida e calor, etc. Esse processo de co-regulação é o que acontece quando nosso cuidador intervém e nos ajuda a entender às necessidades do nosso corpo, seja para regulação ou sobrevivência.
Existe uma necessidade contínua de compreensão do indivíduo autista e uma equipe multiprofissional para que uma pessoa autista tenha acesso à co-regulação de forma adequada. Essa interação é necessária para construir uma compreensão do que está acontecendo no corpo, levando à consciência interoceptiva. A interocepção é conhecida como o oitavo sentido, responsável pela percepção de fome, sede, sensações de calor e frio, fadiga ou bexiga cheia, por exemplo. Para se autorregular, a pessoa precisa entender o significado dos sinais do seu corpo e, então, buscar o que precisa em determinados momentos para regulação e conforto. É necessário ter experiências repetidas de co-regulação com uma pessoa regulada antes de você conseguir se autorregular.
A ansiedade e as crises são resultados da dificuldade de autorregulação. Tornando difícil processar as emoções, ficar em repouso e se concentrar para participar de atividades. Autistas podem ter a necessidade de ter outras pessoas como sistemas nervosos externos para lidar com o estresse a ansiedade. Quando adultos autistas co-regulam com outras pessoas, encontram espaços seguros para recorrer em momentos de estresse. Quando pessoas desreguladas recebem apoio e empatia, elas serão capazes de se regular melhor ao longo do tempo.
É possível ressignificar muitas das características do transtorno ao se identificar com os pares autistas, além de isso permitir reconhecer, respeitar e lidar com as próprias limitações e dificuldades. Observar no outro um sentimento que reprimimos nos ajuda a compreender que podemos de fato sentir, criando padrões de reconhecimento e aceitação.
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Baseado no texto: Co-regulação – A ponte para a autorregulação do blog Autism Awareness Centre Inc. e adições autorais.











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